PRIMEIRO DIA DE ESCOLA DO ESCRITOR HUMBERTO DE CAMPOS
Humberto de Campos famoso escritor brasileiro que viveu em Parnaíba parte de sua infância
Escreveu vários contos sobre sua infância em sua cidade, Miritibe e também sobre cidade de Parnaíba
São contos lindos e você vai ficar encantada (o).
Se você nunca teve oportunidade de saber sobre isso
A hora é agora!
INTRODUÇÃO
Neste post, Humberto de Campos narra seu primeiro dia de escola. Marcado na memória pela figura apavorante do professor.
Acostumado à liberdade e às travessuras não resistiu duas horas de aula e fugiu preferindo uma surra de corda a voltar para a escola.
Tenha um momento de deleite diante deste conto. Em que Humberto de Campos narra momentos marcantes de sua infância.
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Boa leitura!!!
ESCRITOR HUMBERTO DE CAMPOS COM 6 ANOS DE IDADE
E, UM DIA, TENDO EU SEIS ANOS E MESES, FUI CONDUZIDO À ESCOLA, COMO UM CABRITO QUE SE LEVA AO MATADOURO.

A PRIMEIRA cousa que de algum modo me atemorizou neste mundo antes dos sete anos não foi, assim, nem a Morte, com o seu mistério, nem minha mãe, com o seu chicote, nem o Anticristo, com o seu uivo apavorante: foi um homem terrível e estranho, cuja figura passeia, ainda, hoje, sinistramente, nos sombrios subterrâneos da minha memória.
Próximo à nossa casa havia uma escola primária, cujo professor tinha sido muito amigo de meu pai. Chamava-se Agostinho Simões. Era um homem alto, forte, moreno, de grandes e trágicos bigodes negros. Completando a gravidade do aspecto, usava, por sofrimentos da vista, óculos pretos. Falecido meu pai, e continuando eu a progredir no meu curso livre de vadiação, resolveu minha mãe prender-me na gaiola do professor Agostinho, para beliscar a alpista graúda do alfabeto. E, um dia, tendo eu seis anos e meses, fui conduzido à escola, como um cabrito que se leva ao matadouro.
HUMBERTO DE CAMPOS CORRE COM MEDO DA ESCOLA

A PALMATÓRIA PÕE HUMBERTO DE CAMPOS PARA CORRER DA ESCOLA
A impressão que tive dessa primeira casa de ensino em que entrei, foi, positivamente, a mais ingrata revelação da minha infância. Era uma sala escura, pavimentada de barro batido. Colocados uns atrás dos outros, e todos na mesma direção, os bancos estreitos, sem encosto nem apoio para os pés. Neles, os alunos, gente humilde e amedrontada. E, diante destes, em uma pequena mesa colocada sobre um estrado, o sr. Agostinho Simões. Dominando a mesa do sr. Agostinho, a palmatória, a indispensável Santa Luzia, terror das mãos infantis.
Entregue ao professor, este me designou uma ponta de banco. Sentei-me. A pessoa que me conduzira regressou, deixando-me abandonado nas mãos do carrasco. E este, como se estivesse esquecido de mim, iniciou a aula. De minuto a minuto um grito estrondava. Urro de onça em curral de bezerros. A bigodeira do professor Agostinho, os seus óculos pretos, a sua cara fechada, as rugas da sua testa, e aqueles roncos que pareciamde trovão entre montanhas, acompanhados, não raro, pelo estalar da palmatória nas mãos sujas daqueles pobres filhos de pescadores, acabaram por aterrorizar-me.
HUMBERTO DE CAMPOS PREFERE APANHAR

– JÁ! VOLTE PARA A ESCOLA! VAI OU APANHA. PREFERI APANHAR
Duas horas depois de ter chegado, eu não podia mais. De vez em quando olhava para a porta de saída, num desejo angustioso de liberdade. Em um ramo de ateira, que se via da minha ponta de banco, dois passarinhos brincavam, perseguindo-se. Até que, em determinado momento, marquei o rumo, e abalei na carreira, porta a fora, como um foguete orientado em sentido horizontal. Vinha de tal modo, que entrei em casa pela porta da rua, atravessei três ou quatro peças, passei pela cozinha e fui parar por não poder ir mais longe, no fundo do segundo quintal.
Ao fim de alguns minutos, aparecia, porém, a pequena distância, o vulto de minha mãe, com um pedaço de corda na mão.
– Já! Volte para a escola! Vai ou apanha.
Preferi apanhar; não fui. À tarde, o sr. Agostinho Simões surgia em nossa casa, rindo à vontade do susto que me pregara, por encomenda de minha mãe. Abraçou-me; fez-me agrados ligeiros, disse-me palavras alegres e amigas. Mas a figura que eu guardei na lembrança foi a do homem de fisionomia trágica e de voz tonitroante, que parecia desafiar o mundo, com os seus óculos, com os seus bigodes e com a sua palmatória.
Em 1910 o professor Agostinho, que faleceu pouco depois, aparecia a minha mãe, em São Luís. Estava alquebrado, velho e cego.
E tão pobre que vivia da caridade pública.
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Fonte
Campos, Humberto de
Memórias e Memórias inacabadas/Humberto de Campos. – São Luís: Instituto Geia, 2009.